Guia musical da Euro: França x Islândia

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No quesito grito de guerra, não tem pra ninguém, a Islândia ganha de lavada. Os vikings mais uma vez querem chegar a Paris e, no fundinho, todos nós estamos torcendo por eles. Mas sabemos que é muita falta de educação tocar o terror na casa dos outros, ainda mais quando o anfitrião recebe com queijo brie, champanhe, pain perdu, bife bourguignon e crème brûlée…

Para deixar a disputa mais equilibrada, vamos mostrar a música contemporânea dos dois países e você escolhe a que gostar mais. Se de um lado temos Les Rita Mitsouko, Indochine e  Noir Désir, do outro encontramos The Sugarcubes, Sigur Rós e Of Monsters and Men. Em comum todas essas bandas tem uma coisa: conquistaram grande sucesso além de suas fronteiras. Quando a música é boa, todo mundo ganha.

C’est comme ça

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Devo confessar que, nos anos 80, meu conhecimento de música francesa se limitava a Edith Piaf, Sacha Distel, Charles Aznavour, Françoise Hardy e aos gemidos de Serge Gainsbourgh e Jane Birkin. Depois vieram Jean-Luc Ponty e seu violino e o papa da new age Jean-Michel Jarre, o primeiro ocidental a tocar na China (tudo devidamente registrado no disco Les Concerts en Chinee, de 1982). Como todo mundo da minha geração, pra mim rock bom era em inglês e ponto final.

Por sorte a vida mostra que nada é absoluto, especialmente na música. É possível mudar e voltar atrás sem nenhuma culpa. Antes do advento MTV, o veículo para as novidades era o rádio e ninguém ligava muito se a música chegava com um, dois ou dez anos de atraso. Assim, fomos apresentados ao som de Teléphone, do ultra cult Mano Negra e da maluquice deliciosa de Les Rita Mitsouko. Alguém disse que a mente que se abre, nunca mais volta ao tamanho original e é a mais pura verdade.

Umas das minhas melhores descobertas foi a Noir Désir. A banda de Bordeaux, uma das fundamentais do rock francês, teve sua cota de desgraças. Em 2003, o vocalista Bertrand Cantat espancou a atriz Marie Trintignant, com quem tinha um relacionamento. Marie, filha do ator Jean-Louis Trintignant e da roteirista Nadine Marquand, morreu dias depois no hospital sem nunca recuperar a consciência. Condenado a 8 anos de prisão, Cantat foi liberado depois de cumpriu metade da sentença e voltou à vida artística em 2008. Dois anos depois, sua ex-mulher Krisztina Rády cometeu suicídio, enquanto Bertrand Cantat estava na casa. O corpo foi descoberto no dia seguinte pelos filhos do casal. O cantor foi investigado e liberado pelas autoridades. O Désir ainda tentou resistir, mas encerrou as atividades em 2010.

Depois dessa bad, vamos aliviar o clima falando de criança, especialmente dos prodígios que venderam zilhões de discos. Em 1987, Vanessa Paradis, ex-Sra. Johnny Depp, com apenas 14 anos, estourou nas paradas do mundo todo com seu primeiro single “Joe le taxi”. Caso ainda mais impressionante é o de Jordy, um garotinho de 4 anos, que vendeu dois milhões de cópias na França e entrou no Guinness Book como o cantor mais jovem a chegar ao primeiro lugar das paradas.

Desde Edith Piaf, as mulheres sempre tiveram grande destaque na música francesa. Seja Mireille Mathieu com seu cabelo de cumbuca ou Jennifer Ayache, vocalista da banda Superbus, o talento das francesas é indiscutível. Espalhadas por todos os gêneros, uma playlist que se preze tem que ter nomes como Camille, Jeanne Cherhal, Coralie Clément, Les Plastiscines, Émilie Simon, Shy’m e Zaz. E tente ficar parado ouvindo o R&B de Ophélie Winter. Se conseguir, você ganha um doce.

No início dos anos 2000, surgiu a nova cena musical francesa, que incorporava pop, rock e jazz à tradicional chanson. Os destaques são Vincent Delerm, Benjamin Biolay, Benoit Doremus, Bénabar, Sansévérino, Zazie, Vincent Delerm e Olivia Ruiz, entre outros.  Uma característica marcante dos expoentes dessa nova geração é a sinergia. As colaborações são frequentes, seja na composição ou nas letras, como o caso de “Jardin D’hiver”, grande sucesso da cantora israelense Keren Ann, escrita em parceria com Biolay.

Quem diria que os franceses seriam mestres em colocar as pessoas pra dançar. Além dos mega-ultra-super-hiper-maxi premiados David Guetta e Daft Punk, nomes como Air, Justice, Vendetta, Laurent Garnier, Joachim Garraud e M83 fazem mais sucesso fora da França que em seu próprio país. Só pra não deixar de falar de futebol, o tema oficial desta Euro 2016, This One’s For You, foi composto por Guetta e desde seu lançamento, há 3 semanas, já teve mais de 32 milhões de visualizações.

Aqui tem um pouco de tudo, só pra você ficar com vontade de ouvir mais.

 

Einn Mol’á Mann

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Ninguém lembrava da existência da Islândia, muito menos que se fazia música por lá. (Até existia um movimento musical e a banda Hljómar, formada em 1963, era considera os Beatles islandeses). Em 1982, o documentário “Rokk í Reykjavík”,  se encarregou de mostrar o que estava acontecendo por lá.  O mundo se apaixonou pela voz de Björk Guðmundsdóttir e por sua carinha de esquimó. O que ninguém sabia é que Björk, apesar da pouca idade, era veteraníssima no circuito musical, tendo participado de bandas fundamentais como Tappi Tíkarrass e KUKL. Sua aventura seguinte foi The Sugarcubes, que chamou a atenção do selo independente britânico One Little Indian e, em 1986,  debutou nas paradas inglesas.

Depois do sucesso de Björk & cia., começou a corrida das gravadoras britânicas para encontrar ‘the next big thing’ da música islandesa. Foi assim que o Sigur Rós foi descoberto. O CD “Ágætis byrjun” garantiu dois anos de sucesso e a possibilidade de abrir os shows do Radiohead. Três músicas desse disco aparecem em “Vanilla Sky”, filme de Cameron Crowe.

Emiliana Torrini é uma das queridinhas da produtora Shonda Rhimes. Suas músicas já apareceram 10 vezes na série Grey’s Anatomy. Torrini também aparece na trilha de O Senhor dos Anéis: As Duas Torres” com a música “Gollum’s Song”.

A TV e a Islândia vivem um sério caso de amor por causa de Game of Thrones. O país foi escolhido como locação do Winterfell e da Muralha da famosa série. Além disso, os produtores não perdem uma oportunidade de incorporar músicos islandesas nos episódios da série. É o caso do Sigur Rós, que se apresenta durante o casamento fatídico casamento do rei Joffrey. Membros da banda Of Monsters and Men aproveitam as pausas das turnês para fazer umas pontinhas como extras.

Como sempre costuma acontecer, membros de bandas de sucesso se arriscam em projetos solo. Olafur Arnalds, ex-integrante da banda experimental múm, é um deles. Na cena musical do país, todo mundo se conhece e a brodagem é tanta os músicos produzem e colaboram em trabalhos uns dos outros.

A música islandesa é única, mágica e inovadora. Ela entra pelos ouvidos, se espalha pela pele, desperta os sentidos e rouba pra sempre o seu coração.

Guia musical da Euro: Eslováquia

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A estreante Eslováquia chegou à Euro vencendo Espanha, Ucrânia, Bielorrússia, Luxemburgo e Macedônia na fase de classificação. Desde 1993 é um país independente. Você sabia que a Eslováquia tem 6000 cavernas? Que os pais de Andy Warhol vieram de lá? E que Bratislava é a única capital do mundo que faz fronteira com dois países? De acordo com o Guinness as modelos eslovacas tem as pernas mais longas. Sabe o carro voador de Blade Runner? Um eslovaco chamado Stefan Klein criou um, batizado de Aeromobil 2.5, que está em fase de testes. Depois de tudo isso, você duvida que eles surpreendam na Euro?

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Guia musical da Euro: Bélgica

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Bélgica, terra de Mr. Poirot e de um monte de invenções que mudaram a humanidade. Se o mundo não está explodindo é graças ao Dr. Ferdinand Peeters, inventor da pílula anticoncepcional. Se você está lendo esse texto, deve agradecer a Robert Cailliau, um dos criadores da rede mundial de computadores, a.k.a internet. Acha pouco? O asfalto, o motor de combustão interna e os patins saíram da cachola de criativos belgas.

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Guia musical da Euro: Alemanha

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Chegou a vez da princesa do baile! A Alemanha é tri na Euro. No quesito música, podemos dizer que os teutônicos são, no mínimo, esquizofrênicos. Dos grandes compositores clássicos à música pop mais bizarra, passando por uma música indie recheada de bandas cult, apresentamos o que toca na vitrola dos alemães.

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Nem Rangers, nem Celtic. Hibernian é o time mais legal da Escócia

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Se pra você a Escócia é só William Wallace, o monstro do Lago Ness, os homens de kilt, o whisky e as gaitas de fole, você está bem enganado. Melhor que tudo isso é o time local e algumas das melhores bandas britânicas de que se tem notícia. Você certamente ouviu muitas delas sem imaginar que eram de Edimburgo. Não importa a sua idade, em algum momento da vida uma banda escocesa vai cruzar o seu caminho. Quanto à combinação futebol e música, meu conselho é: aprecie sem moderação.

Sábado passado, o Hibernian conquistou um lugar na final da Copa da Escócia, vencendo o Dundee United na disputa de pênaltis por 4 a 2, graças a uma partida ao melhor estilo Fernando Prass do goleiro Conrad Logan. Você que gosta do futebol raçudo, futebol de raiz, sabe que estou falando do time mais bacana da Escócia, não é? Ele é verde. Ele é cult. Ele tem os melhores torcedores. Ele tem os “Famosos 5”, que encantaram o mundo e quase vieram parar no Vasco. E rendeu esta playlist simplesmente sensacional. Precisa dizer mais alguma coisa? Sim!

Hibernia é a palavra romana para Irlanda, então nada melhor que usá-la para batizar um time de malucos irlandeses. Assim, em  1875, nasceu o Hibernian, ligados ao movimento revolucionário irlandês, no bairro de Leith, em Edinburgo, capital escocesa. Resistência é a palavra ordem e nem as andanças pela segundona ou chegar às portas da falência conseguiram abalar o espírito por lá. Quem torce pro Hibs é acima de tudo um forte.

A lista de torcedores é recheada de gente famosa. Irvine Welsh, genial escritor que, entre outras coisas, presenteou a humanidade com Trainspotting é Hibby desde criancinha.  O tenista Andy Murray é outro ilustre defensor das cores do Verdão da Escócia. O ator Dougray Scott, várias vezes cogitado para ser 007, que pode ser visto em Impacto Profundo, Missão Impossível II, Enigma e Desperate Housewives, não esconde sua paixão de ninguém. Fish, lendário vocalista do Marillion, pode ser visto nas arquibancadas do Easter Road.

Temos também toda a maravilhosidade de Shirley Mason, do Garbage. Roddy Frame, vocalista da banda Aztec Camera, garante seus ingressos permanentes para toda e qualquer temporada, seja em que divisão for. Mas o caso de amor mais profundo é o da banda The Proclaimers, que dedicaram não uma, mas três músicas pro Hibernian e ainda colaboraram ativamente na campanha “Hands off Hibs”, que ajudou a tirar o time do buraco em 1990. E não podemos esquecer de Alex Rolim, o cara pra quem esta playlist é dedicada.

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Até na ficção o time mais verde que as pastagens escocesas se destaca. Quando Danny Boyle adaptou Trainspotting para o cinema, deu ao Hibs papel de destaque. Begbie, nosso psicopata favorito, aparece endossando a gloriosa camisa do time numa partida de society. Renton, o personagem principal, além da camisa verde e branca, tem a parede do quarto cheia de posters do clube.

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Um caso curioso é o do Inspetor Rebus, personagem da série de livros do escritor Ian Rankin que, na adaptação para TV, virou a casaca e passou de torcedor do Raith Rovers à fanático pelo Hibernian a ponto de frequentar um pub que vive cheio de Cabbages em dia de jogo. Ironicamente, o ator que interpreta o inspetor, Ken Stott, torce para o arquirrival Hearts.

O Hibernian pode não ser o time mais vitorioso da Escócia, mas tem história. Foi o primeiro time britânico a participar do Mundial de Clubes, no Rio em 1953. Também foi convidado para a primeira Copa Europa, em 1955, mesmo tendo terminado o campeonato escocês em 5º lugar. E não fez feio! Caiu na semifinal contra o Reims, que terminou perdendo pro Real Madrid na final.

Se isso não bastasse, o Hibs tem os melhores atacantes da história do futebol escocês. Gordon Smith, Bobby Johnstone, Lawrie Reilly, Eddie Turnbull e Willie Ormond, conhecidos como “Os Cinco Famosos”, tem lugar de honra no Hall da Fama da Federação Escocesa e, na reforma de 1995, a Curva Norte do estádio Easter Road passou a ser dedicada a eles. Depois do Mundial de Clubes, em 53, o Vasco tentou de todas as maneiras contratar Johnstone e Turnbull e os escoceses gostam de dizer que os ‘Cinco’ foram a inspiração para a geração seguinte do futebol brasileiro.

Eddie Turnbull, não contente em ser um dos maiores jogadores da história do clube, voltou como treinador, em 1971. Com Eddie no comando os “Tornados de Turnbull” chegaram a ser a terceira força do futebol escocês, com dois vice campeonatos, em 1974 e 1975, e o título da Copa da Liga em 1972. Também foram bicampeões da Crybrough Cup em 1972 e 1973, mas a maior façanha para a torcida é a vitória por 7×0 em cima do Hearts, maior rival, na casa do adversário em 1973.

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A playlist de hoje tem o crème de la crème da música escocesa. É provável que algum torcedor do Hearts tenham se infiltrado na lista. Nunca se sabe. Aumenta o volume e aperta o play.

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Mais que azul, o Leicester é a coisa mais quente

A nossa playlist desta semana é para você, caro leitor, que acalenta no fundinho do seu coração o desejo secreto de ver o Coiote pegar o Papa-léguas, o Sargento Garcia prender o Zorro, o rato comer o gato e o Leicester campeão da Premier League. Nós valorizamos gente como você, camarada, que tem o coração cheio de esperança.

Antes desta temporada de Cinderela, ninguém dava a menor bola pro Leicester. Ninguém sabia onde ficava e nem que algumas das melhores invenções do mundo saíram da cachola de filhos da terra. O DNA foi descoberto por Sir Alec Jeffreys na universidade de Leicester. Em 1937, Donald Hings inventou o walkie talkie. É de lá uma das mais bizarras categorias do esporte radical: o extreme ironing, que consiste em passar roupa no alto de um penhasco. Quer saber onde surgiu a bolinha de golfe furadinha? BINGO! William Taylor registrou a patente da dita cuja em 1905.

Se formos falar de história, então… Eis alguns personagens históricos que vieram da simpática cidade: Lady Jane Grey, que foi rainha da Inglaterra por apenas nove dias, Joseph Merrick, o Homem Elefante, e Simon de Montfort, fundador do Parlamento inglês. Até desenterraram uma ‘maldição’ sobre o fantasma de Ricardo III, que só deixou a cidade em paz depois que sua ossada foi sepultada na catedral.

Só por ter presenteado o mundo com Graham Chapman, do Monty Python, eu já acho Leicester um dos melhores lugares da galáxia. E ainda tem Joe Orton, autor de teatro. E Stephen Frears que, entre tantos filmes incríveis, dirigiu um filme sobre Orton, “O Amor Não Tem Sexo”, com o maravilhoso Gary Oldman. E tem Richard Armitage, que todo mundo conhece como Thorin, do Hobbit, ou como Dragão Vermelho da série Hannibal, mas eu prefiro lembrar dele como John Thornton de Norte & Sul, que não deixa nada a desejar a Mr. Darcy, o melhor – e mais amado – personagem masculino da literatura mundial na categoria marido ideal.

Como nem tudo na vida é alegria, é de Leicester a menina Madeleine McCann, que desapareceu na Praia da Luz, no Algarve, em Portugal e até hoje não foi encontrada.

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Vamos ser honestos e dizer que ninguém tava nem aí pro Leicester quando ele estava no borralho esfregando o chão das últimas posições e tentando fugir do rebaixamento. Aí, o simpático Claudio Ranieri fez sua mágica de fada madrinha e transformou o sonso LC na bela do baile, que deixou pra trás beldades ricas, estreladas e poderosas como United, Chelsea, City e Arsenal e encantou o mundo. Faltam apenas algumas semanas para o sonho virar realidade, e o Leicester City já conseguir um feito histórico. Por isso, hoje vamos homenagear  aqueles que nunca deixaram de acreditar.

A playlist desta semana é de músicos da cidade, alguns até torcedores do City. Começando com The Five Dallas Boys, a primeira boy band de que se tem notícia, passando por Engelbert Humperdinck, o cara que estourou o cafonômetro com seu cabelo cheio de laquê, seu bigode de narcotraficante e suas calças boca de sino. O Leicester parece ser o time favorito de baixistas, tecladistas e bateristas. A lista é longa: John Deacon, John Illsley,  Jon Lord, Tony Kaye, Richard Hughes, Frank Benbini e Robert Gotobed. Pra mostrar que somos ecléticos juntamos brega, punk, indie e pop, e não esquecemos o padrinho do Ska, Laurel Aitken – cubano de nascimento mas Fox no coração – nem a DJ Lisa Lashes. Sing-a-long!

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Hark Now Hear the Leicester Sing (Nel Blu Dipinto Di Blu)

 

O orgulho de Manchester: entre o futebol e a música

Todo Futebol estreia editoria especialmente planejada para os que apreciam futebol e música. A cada post, faremos uma playlist temática. Nada melhor do que começar com o grande clássico de Manchester entre United e City. Coloque seus fones de ouvido.

Manchester, England, England, across the Atlantic Sea…” grita o refrão da canção de Hair – a peça, o filme, escolha o seu -, mas Manchester não é só isso. Esqueça Londres, esqueça Liverpool, Manchester é a cidade mais famosa quando o assunto é futebol. E, de quebra, produziu algumas das melhores bandas dos últimos 35 anos.

Berço da Revolução Industrial, ao que parece a feiura cinzenta e gélida é propícia para o surgimento de novas ideias tanto sociais quanto culturais. Foi lá, por exemplo, que surgiu o movimento sufragista feminino e onde aconteceu o encontro de Friedrich Engels e Karl Marx. Manchester só não é democrática quando o assunto é futebol. Por lá, se você não é United, é City e fim de papo.

A rivalidade não está restrita aos confins de Old Trafford ou do Etihad Stadium. Algumas bandas da cidade competiram, discutiram, se odiaram por décadas. Talvez menos do que os irmãos Gallagher odeiam um ao outro mas na música, como no futebol, as paixão são insanas e inexplicáveis.

Para resolver o problema, fizemos duas playlists bastante democráticas de músicos que são fanáticos torcedores tanto dos Reds quanto dos Blues. Na nossa arquibancada punks, pops, góticos, depressivos e indies convivem pacificamente. Divirtam-se!

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MANCHESTER CITY

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Outro ano, outro Sanremo

Prima serata del 63esimo Festival della canzone italiana

Sanremo é cafona, é caótico, é injusto, mas não consigo deixar de assistir. Porque Sanremo é exatamente aquilo que promete: popular. As regras podem mudar todo ano, mas uma coisa continua sempre igual, é o público que decide quem ganha.

Este ano rolou um ‘bis’ na apresentação, com Fabio Fazio e Luciana Littizzetto, e na regra do ano passado de cada cantor apresentar duas músicas e uma delas é escolhida pelo publico, através do telefone.

A Itália é o Brasil, com mais idade, drama e manjericão, então, não podia faltar um furdúncio. O pobre Fazio foi interrompido no seu monólogo inicial por dois operários que resolveram tentar  suicídio ameaçando se jogar do alto do teatro Ariston. No começo ninguém sabia se era verdade ou brincadeira – de péssimo gosto – mas a realidade pode ser mais bizarra que a ficção e a mente cafeinada de qualquer roteirista. Momentos de emoção, famosos se retirando, porque vai que os caras resolvem mesmo pular. Tudo isso ao vivo, sem break comercial, nego gritando como se estivesse num cortiço, as pessoas aplaudindo, dez minutos dignos de um filme de Fellini.

Passando ao que interessa, Sanremo começou no dia 18 de Fevereiro, aniversário de Fabrizio De André, e para não deixar a data passar em branco teve Luciano Ligabue cantando “Crêuza de mä”, em genovês, acompanhado de Mauro Pagani, autor da música, e as presenças da viúva Dori Ghezzi e do filho Cristiano. Ligabue casou, mudou, deu um tapa no visual e até perdeu aquele ar de quem levanta uma parede em um dia. Fez o que sabe fazer melhor, cantou lindamente.

Aí chega o momento de Lucianina Littizzetto. Quebrei a cabeça pra achar uma correlativa brazuca pra ela e não achei. A coisa que chega mais perto é Dercy Gonçalves, mas muitos graus abaixo. La Littizzetto fez sua entrada, no melhor estilo Crazy Horse, e seu monólogo de abertura foi tão cheio de duplo sentido que o botox das senhoras respeitáveis da platéia venceu tentando disfarçar o constrangimento.

A primeira concorrente é Arisa, com sua cara de Piu Piu e sua voz de periquito usando o batom mais equivocado da história da maquiagem, que faria Max Factor girar na cova feito frango de padaria. Canta duas músicas, a primeira, bem legal, é claaaaaaro que não foi escolhida. Da segunda falaremos mais pra frente. Ou não.

Apresentado como o ‘pai do pop italiano’ (eu faria um DNA urgente pra verificar a paternidade), Frankie Hi-Nrg Mc. A única coisa ‘High Energy’ do fulano é a quantidade de medicamentos para pressão alta que ele toma todas as manhãs. Pouparei vocês da minha sincera opinião sobre as duas tranqueiras que este senhor cantou.

Pausa na parte musical e hora da convidada especial, Laetitia Casta. Lindá, modelá, francesá, La Castá assassinou com três tiros a queima-roupa ‘Meraviglioso’ de Domenico Modugno. De boca fechada Laetitia é Maria Callas. Ela tentou melhorar as coisas dançando de maiô, mas o estrago já estava feito.

Sanremo gosta de arrancar umas lágrimas, então, não faltaram homenagens. Parece que o Ceifeiro teve bastante trabalho nos últimos meses e promoveu uma verdadeira chacina no mundo musical italiano. Enzo Jannacci, o maestro Claudio Abbado, Freak Antoni e Francesco Di Giacomo foram lembrados com vídeos e músicas.

Segue o enterro – tenham em mente que são 14 concorrentes – Antonella Ruggiero, fundadora do grupo Matia Bazar, é uma daquelas cantoras que flerta com a música lírica. Pra meu desespero. Não sei se foram as horas infinitas dos Três Tenores e aqueles shows para os pobres de algum canto do mundo com Pavarotti (que Deus o tenha em bom lugar com direito a buffet variado), ou se foram os musicais da Broadway de Andrew Lloyd Webber que me causaram uma gastura toda vez que alguém manda um vibrato.

Raphael Gualazzi conquistou meu coração de pedra, em 2012, com “Follia d’Amore”, e meu amor resistiu bravamente às duas músicas meia-boca que ele cantou no ano passado. Este ano foi a pá de cal, porque Raphael resolveu se apresentar com a dupla de música eletrônica dos mascarados, The Bloody Beetroots. Se em dois anos Raphael sofreu um processo de desembarangamento, ficou chato bagarai.

Todas as revistas de fofoca dizendo que Raffaella Carrà tava às portas da morte e ela aparece cantando e dançando com salto 15 aos 70 anos. Se ela tá mal, eu tô tecnicamente morta.

É a vez de Cristiano De André. Apesar de ser a fuça do pai e não cantar mal, o pobre deve ter passado sempre com a água pelo peito, como todo ‘filho de’. Ele é a Maria Rita, versão masculina e italiana, que só consegue enganar quem nunca ouviu ou esqueceu como era o original.

Primeiro grupo a participar é Perturbazione e faz a gente sentir saudade do Modà. Volta Modà!

Giusy Ferreri não é uma má menina, o problema é a voz bizarra. Ela até engana por uns 2 minutos, aí começa a gritaria. Chamar de gralha ofende toda a categoria.

Francesco Renga… Quando não se tem nada de bom pra dizer, a gente repara que o cara tá usando toda a prata do Universo nos anéis e nas pulseiras.

A primeira coisa que pensei quando vi Giuliano Palma é que ele é a fuça de Arrigo Sacchi. E a música não é ruim, mas é daquelas que grudam na cabeça e nem lobotomia tira.

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Noemi! Minha favorita. Mesmo que ela tenha acabado com toda tintura vermelha da Itália e agora use uma franja de mongPIN UP, Lilian, PIN UP! Mesmo com um vestido que traz como detalhe um troço que lembra aquele aparelho arreio de cavalo. Mesmo que eu nem tenha conseguido prestar atenção nas músicas pra escolher uma. Canta qualquer coisa aí, Noemi, porque sua voz é foda.

Renzo Rubino é o Gualazzi de 2012. O estreante na categoria principal se apresentou ao piano e mandou uma musiquinha tão legal que, sem perceber, você fica cantarolando o dia inteiro.

Ron. Voz de velho, música de velho, mania de velho de cantar mezzo italiano mezzo inglês, um toupet de castor morto na cabeça… É velho, véi!

Riccardo Sinigallia é metade da dupla Tiromansino. Pelo visto, a parte dele é a Tiro, porque foi o que ele deu no pé inscrevendo em Sanremo uma música que já tinha tocado. Qual parte do inédito você não entendeu Riccardo? Foi desclassificado.

Eu bem tentei prestar atenção na música de Francesco Sarcina, mas fui hipnotizada pelos brincos dele. É tudo que posso dizer.

Quem escolheu as atrações internacionais deste ano está sob efeito de drogas pesadas. O primeiro foi Cat Stevens ou Yusuf Islam ou Yusuf ou Steven Demetre Georgiou, seja lá qual o nome que ele estiver usando no momento, na hora que ele canta “Father & Son” você espera a entrada de Suplicy e do Supla. O segundo foi Rufus Wainwright, que passou o tempo todo com cara de “Onde eu fui amarrar meu jegue?”. O terceiro foi Damien Rice, que só tem duas músicas. Adivinhem o que ele cantou? Paolo Nutini, modernoso e, provavelmente, o único oriundi que não fala nenhuma palavra de italiano.

Minha falta de saco pra Sanremo já estava preocupante, então, resolvi consultar as bases pra saber se gostamos ou não de Claudio Baglioni. Gostamos! E ele canta tudo que nos faz gostar dele, um medley dos bons, ele ao piano. E só em pensar em ouvir o resto dos péla saco que ainda faltam cantar, dá voltade de pedir pra ele ficar cantando até amanhã.

Quando eu já estou acostumando com as músicas que o público escolheu, lembro que ainda tem a categoria “Giovani Proposte”. Este ano a coisa estava particularmente ruim, mas sempre dá pra salvar um e o nome dele é Zibba.

O quarto dia foi o dia das covers e dos encontros, no mínimo, inusitados, que começou com o mala ganhador do ano passado, Marco Mengoni, estragando “Io che amo solo te” de Sergio Endrigo. Teve Arisa cantando “Cuccurucucu”, de Franco Battiato, com a banda dinamarquesa Whomadewho, que se alguém conhecer ganha um doce. Cristiano De André cantando “Verranno a chiederti del nostro amore” do pai, Fabrizio. Noemi ao piano cantando “La costruzione di un amore”, que Ivano Fossati escreveu para Mia Martini. O chatissimo Francesco Renga cantou com Kekko, do Modà, “Un giorno credi” de Edoardo Bennato. Giuliano Palma cantando “I say i’ sto cca” de Pino Daniele. Ron mandou “Cara” de Dalla. Frankie Hi-Nrg e Fiorella Mannoia competindo pra ver quem cantava pior “Boogie” de Paolo Conte. Renzo Rubino com Simona Molinari cantaram “Non Arrossire” de Giorgio Gaber. E Perturbazione cantou “La donna cannone” de Francesco De Gregori com a participação de Violante Placido.  Antonella Ruggiero acompanhada pelo DigiEnsamble Berlin cantou “Una Miniera” dos New Trolls. Vencedor no quesito parceria mais bizarra, Raphael Gualazzi convidou Tommy Lee, do Motley Crüe, para acompanhar na bateria “Nel blu dipinto di blu”, mais conhecida como “Volare ô ô”, de Domenico Modugno. Eu esperava que, pelo menos, Tommy Lee entrasse pelado pra coisa fazer algum sentido, mas não rolou. Empatados em segundo lugar Giusy Ferreri, Alessandro Haber e Alessio Boni, bem louco de Velho do Rio, cantando “Il mare d’inverno” de Enrico Ruggeri e Francesco Sarcina com Riccardo Scamarcio, mais conhecido como marido de Valeria Golino, na bateria pra “Diavolo in me” de Zucchero. E ainda teve uma colher de chá para o desclassificado Riccardo Sinigallia cantar “Ho visto anche degli zingari felici” de Claudio Lolli com Paola Turci e Marina Rei.

Quarta serata del 64esimo Festival della canzone italiana

Todo este suplício só foi tolerado para ver Gino Paoli, acompanhado de Danilo Rea, um dos melhores pianistas de Jazz da atualidade. Teve Tenco. Teve Bindi. E teve Paoli. Quinze minutos de pura e sublime genialidade.

No fim, ganhou Arisa com sua voz de periquito. E o que aprendemos nesses 5 dias de festival? La Littizzetto continua sendo a melhor coisa da TV italiana, Noemi é disparado a melhor jovem cantora, Gino Paoli é Deus e o CD de Zibba é a única coisa que tenho escutado nos últimos dias. No ano que vem tem mais, porque eu adoro odiar Sanremo.

*Publicado originalmente no Portale Eh Già