Guia musical da Euro: Bélgica

image

Bélgica, terra de Mr. Poirot e de um monte de invenções que mudaram a humanidade. Se o mundo não está explodindo é graças ao Dr. Ferdinand Peeters, inventor da pílula anticoncepcional. Se você está lendo esse texto, deve agradecer a Robert Cailliau, um dos criadores da rede mundial de computadores, a.k.a internet. Acha pouco? O asfalto, o motor de combustão interna e os patins saíram da cachola de criativos belgas.

Depois de intrincados e mirabolantes cálculos, a FIFA chegou à conclusão que a Bélgica é a melhor seleção europeia do momento. (Até março era a melhor do mundo, mas a Argentina recuperou o lugar sabe-se lá como). No ranking da UEFA, figuram num honroso 9º lugar. Mas onde os belgas são mesmo ecléticos é na música: de Plastic Bertrand a Front 242 em menos de 2 segundos.

Breve história sobre a Bélgica na Euro

701969-belgium-afp-national-team-2

Os belgas participaram de quatro edições da Euro. Por duas vezes foram anfitriões do torneio: em 1972 e em 2000, junto com a Holanda. Em 1972, depois de perder a semifinal para a Alemanha Ocidental por 1-2, venceram a Hungria por 2-1, garantindo o terceiro lugar.

O melhor resultado dos Diabos Vermelhos foi o vice-campeonato na Euro 1980, disputada na Itália. Outra vez a Bélgica encontrou a Alemanha Ocidental na final do torneio. A Alemanha abriu o placar com Horst Hrubesch, mas os belgas foram atrás e empataram com o pênalti cobrado por René Vandereycken. Faltando dois minutos para acabar a partida, os alemães jogaram água no chopp dos belgas, com outro gol de Hrubesch.

Fique de olho

Belgium

A Bélgica foi uma grata surpresa na Copa de 2014. Na fase de grupos, venceu todos seus adversários por 1 a 0, mas compensou no jogo contra os Estados Unidos. O goleiro americano Tim Howard defendeu nada menos que 15 bolas e a vitória dos belgas, por 2 a 1,  só veio na prorrogação. A aventura brasileira terminou na partida contra a Argentina, quando foram derrotados por 1 a 0.

O mundial serviu como vitrine, porque pudemos conhecer melhor os jogadores belgas. Entre aqueles capazes de encher os olhos estão Marouane Fellaini (Manchester United), Radja Nainggolan (Roma), Kevin De Bruyne (Manchester City), Eden Hazard (Chelsea) e Dries Mertens (Napoli). Quem também pode supreender são os ‘espanhóis’ Thomas Vermaelen, do Barça, Yannick Carrasco, do Atlético Madrid, e o garoto de apenas 20 anos, Zakaria Bakkali.

Musica, maestro!

Começamos, como sempre, falando de música clássica. Como os compositores belgas não são muito conhecidos, fizemos uma pequena lista dos mais famosos. A maioria trocou a Bélgica por Itália e França, como Johannes Ciconia e Guillaume Dufay. Gilles Binchois e Johannes Ockeghem fizeram sucesso entretendo reis e rainhas franceses.

Na ópera, a Bélgica tem alguns representantes conhecidos mundialmente, como os barítonos Jules Bastin e José van Dam. Já o eclético tenor Helmut Lotti canta em vários estilos e línguas. Wieland Kuijken e Marcel Ponseele são responsáveis pelo renascimento da música barroca. No  final do século XX, seus grupos La Petite Bande e il Gardellino fizeram uma releitura do estilo, possibilitando que novas gerações pudessem descobri-lo.

Por uma coisa o mundo deve agradecer eternamente aos belgas. Um dos mais importantes e famosos instrumentos de Jazz foi inventado lá por um tal de Adolphe Sax. E já que o assunto é Jazz, não podemos esquecer do primeiro músico do gênero que nasceu na Europa, Django Reinhardt. O guitarrista cigano revolucionou o estilo com seus improvisos. Se você não conhece, não sabe o que está perdendo. E aproveite para assistir o filme de Woddy Allen, “Poucas e Boas”, com Sean Penn e Samantha Morton, que é uma deliciosa homenagem ao grande guitarrista.

Outro grande nome é Toots Thielemans, o maior gaitista do século. Sério, é uma coisa do outro mundo! Ainda bem vivo, Thielemans, de 94 anos, tem muitas histórias para contar, já que tocou com todos os grandes músicos, de Charlie Parker a Oscar Peterson, passando por Miles Davis, Elis Regina, Bill Evans e Édith Piaf.

Agora chegamos ao grande ‘chansonnier’ Jacques Brel. David Bowie e Frank Sinatra eram fãs e a música “Ne me quitte pas” foi gravada até por Cassia Eller. Brel foi fonte de inspiração para vários cantores, até para aqueles que beiravam o brega como Salvatore Adamo e Frédéric François. O charme de Brel era cantar em francês, mas Kor Van der Goten e Jan De Wilde fizeram bastante sucesso no gênero cantando em holandês.

Bobbejaan Schoepen é considerado o pioneiro da música pop belga. Não satisfeito em ser o primeiro cantor a ter sucesso internacional, foi visionário no uso de amplificadores, ônibus para tour e o esquema de patrocínio. Bobbejaan gravou em dialeto e introduziu o assobio como instrumento musical. Isso nos anos 40!

As tradições folclóricas ficaram aos cuidados de músicos como Wannes Van de Velde e Willem Vermandere. Festivais anuais mantém a música tradicional viva em várias regiões do país.

Em 1959, Rocco Granata, filho de imigrantes italianos, chegou ao topo das paradas europeias com a música “Marina”. A canção fez tanto sucesso que ganhou versões nas vozes de Louis Armstrong e Dalida. Em 2013, Rocco ganhou uma cinebiografia de mesmo nome, dirigida por Stijn Coninx.

O rock belga tem alguns representante que fizeram considerável sucesso internacional. The Pebbles emplacou dois sucessos, “Seven Horses in the Sky” e “I Get Around”.  The Wallace Collection chegou às paradas com “Daydream”, música que se você nunca ouviu, seus pais com certeza conhecem.

A banda punk Plastic Bertrand é tão famosa que, vez ou outra, sua música sua pipoca em um filme ou uma propaganda. Escute “Ça Plane Pour Moi” e diga se não ouviu antes. A música vendeu perto de 1 milhão de cópias em todo mundo e foi regravada por Sonic Youth, Vampire Weekend, The Presidents of the United States e Nouvelle Vague.

Em 1979, depois de um show de Joy Division e do Cabaret Voltaire no Plan K, em Bruxelas, nasceu a gravadora “Les Disques du Crépuscule”. O selo, em associação com a mítica gravadora inglesa Factory, fez a ponte entre a música de Manchester e a Europa e vice versa. Sua fundadora, a jornalista Annik Honorè, é mais conhecida como a musa para quem Ian Curtis escreveu “Love Will Tear Us Apart”. Annik morreu em 2014, aos 56 anos, 34 anos depois do amado.

A banda TC Matic não saia das paradas, com músicas como “Oh la la la” e “Putain Putain”.  Anos depois, o vocalista Arno começou um bem sucedida carreira solo. Pra colocar mais molho nessa estranha salada musical temos Soulsister, com “The Way To Your Heart”, Vaya Con Dios com “Puerto Rico” e Clouseau com “Daar gaat ze” que, por mais bizarro que possa parecer, venderam milhões de cópias.

A banda  dEUS, além de ser a mais famosa, é a mais interessante quando se fala em música indie. Com vocais femininos, K’s Choice e Hooverphonic aproveitaram o  caminho aberto pelas bandas gringas Garbage e Cranberries.

Stef Kamil Carlens, um dos fundadores de dEUS, abandonou a antiga banda para começar um novo projeto, Zita Swoon, um tipo de coletivo musical que tem a colaboração de diversos artistas internacionais para criar músicas experimentais e multidisciplinares.

A música eletrônica belga caiu no gosto das gravadoras e fez um estrondoso sucesso comercial. É preciso uma lobotomia para tirar “Pump Up The Jam” do Technotronic da cabeça.

Para encerrar, um favorito pessoal, o Front 242. Em 1981, a dupla formada por Daniel Bressanutti e Dirk Bergen inventou o que mais tarde seria conhecido como ‘Electronic Body Music’, uma mistura de música industrial com sintetizadores. Se interessou? Escute “Front by Front”, CD de 1988.

Ik ben verloren

2 comentários

  1. Camila Lima · maio 24, 2016

    Lilian, parabéns pelos artigos. Um mais perfeito que o outro. Não conhecia o todofutebol e o que me trouxe ao site foram os seus artigos. Me encantei pela música albanesa. Na minha playlist diária tenho artistas que conheci através de você. Parabéns novamente. Manda mais que eu quero. hahaha

    Curtir

    • Lilian Trigo · maio 24, 2016

      Obrigada, Camila! Seu comentário foi a coisa mais legal que li nos últimos tempos. É muito bom saber que você chegou aqui por causa dos posts de música. Vem mais coisa por aí. E escreva sempre que quiser.

      Curtir

Deixe um comentário