O disco profético que antecipou a maior vitória da história do Hull City

As vitórias do Hull City contra equipes de Londres foram profetizadas, 22 anos antes, no disco da banda inglesa “The Housemartins”. Montamos um panorama da conturbada época em que o disco foi lançado e contamos um pouco sobre a cena musical da cidade. E falamos até de futebol.

A década de 80 foi desastrosa para o futebol e para a política, mas foi maravilhosa para a música. Os ingleses viram uma mulher Primeira Ministra. Mulher no poder não chega a ser novidade por lá, porque de rainha eles entendem, mas as moradoras de Downing Street costumam ser as esposas e as filhas do Premier.

Margaret Thatcher chegou e resolveu mostrar que era melhor que qualquer homem. Suas medidas de austeridade fizeram a Inglaterra mergulhar na pior crise desde a Revolução Industrial. Maggie bateu de frente com operários e mineiros, provocou o IRA e foi a responsável pela greve de fome que causou a morte de Bobby Sands e mais 9 presos da prisão de Maze, na Irlanda do Norte – e, finalmente, depois das tragédias de Hillborough e Heysel, voltou os olhos para o futebol e decretou que este era o inimigo público número 1. O Liverpool foi banido das competições esportivas por 5 anos e alguns torcedores por toda vida. Como era difícil separar o torcedor comum das maçãs podres do hooliganismo, o melhor a fazer era enfiar todos no mesmo balaio de gatos.

O que fazer quando não se pode ir ao estádio? Você monta uma banda! E assim, pipocaram bandas de diversos estilos por todas as partes do território inglês. Londres não era mais o berço da contracultura, da moda e das tendências musicais. As pessoas queriam ouvir coisas novas, não importava de onde viessem.

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Hull é uma pequena cidade. Se não contribuiu em nada na história inglesa, os nativos gostam de lembrar dos músicos que chegaram ao topo das paradas de sucesso. O maior deles é Mick Ronson – nenhum parentesco com os irmãos Mark e Samantha Ronson – líder dos Spiders from Mars de David Bowie e o gênio invisível por trás de discos como “The Man Who Sold the World”, “Hunky Dory”, “Ziggy Stardust”, “Aladdin Sane” e “Pin Ups”. Acha pouco? Ele ainda fez parte do Mott the Hoople, tocou com Lou Reed, Bob Dylan, Van Morrison e produziu o CD mais pesado de Morrissey. Sabe aquele pianinho que você adora em “Perfect Day” de Lou Reed? É dele.

Ronson abriu as portas e os músicos de Hull aproveitaram a oportunidade. E assim começou a história dos “4 de Hull” a chegar no Top 10 inglês. A banda Red Guitars durou apenas 4 anos, de 1982 a 1986, mas emplacou dois hits em primeiro lugar: “Marimba Jive” e “Be With Me”. Em 1984, o Everything But the Girl – ou simplesmente EBTG – bateu na trave com o primeiro disco, “Eden”, alcançando o 14º lugar na parada de discos. Um ano depois, chegaram ao 10º lugar com o disco “Love Not Money”. Em 1996 ficaram famosos mundialmente com a música “Missing”. O terceiro nome é o Fine Young Cannibals. Duas músicas do seu disco de estreia, de mesmo nome, lançado em 1985,  chegaram em 8º lugar. Uma delas é a versão super swingada de “Suspicious Minds” de Elvis Presley.

Mas o que tudo isso tem a ver com futebol? Péra, já explico.

O Hull City é um time de pouca ou nenhuma tradição, já que o esporte mais importante na região é o rugby. Os Tigres subiram duas vezes para a primeira divisão, mas não ficaram muito tempo por lá. Não era por seus feitos futebolísticos que o time aparecia no noticiário. Em 1984, o presidente do clube anunciou que o Hull City seria o primeiro time de futebol a jogar na lua. Você não leu errado, é isso mesmo. Don Robinson levou os jogadores para a base da NASA em Cabo Canaveral, mas não encontrou nenhum adversário que topasse a parada.

Enquanto o time fazia sua excursão americana e esperava um adversário para a partida em solo lunar, The Housemartins conseguiam o tão sonhado contrato com a gravadora independente Go! Discs Records. Formada em 1983, e autodenominada a “quarta melhor banda de Hull”, logo de cara emplacaram o single “Happy Hour” em terceiro lugar na parada.

Era hora de pensar no disco, a começar pelo nome. Paul Heaton, Stan Cullimore, Norman Cook – que depois do fim da banda viraria o famoso DJ Fatboy Slim – e Dave Hemingway eram malucos por futebol e resolveram vingar o orgulho ferido dos torcedores do Hull City no nome de seu primeiro disco. E assim nascia a maior profecia da história do futebol inglês.

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Corta para o dia 19 de outubro de 2008. O recém promovido Hull City recebe o West Ham United no KC Stadium pela Premier League. Nos meses anteriores, o time já tinha vencido  Fulham, Tottenham e Arsenal e uma vitória sobre o West Ham garantiria um inédito terceiro lugar na tabela. Aos 6 minutos do segundo tempo, o escanteio cobrado por Andy Dawson encontra a cabeça de Michael Turner, que marca o único gol do Hull na partida.

Adivinhe as manchetes dos jornais no dia seguinte. Duas rodadas depois, o City perdeu para o Chelsea por 3 a 0, mas quem se importa? A temporada 2008/09 foi um verdadeiro sonho para os torcedores dos Tigers, que, além de ótima campanha na Premier, chegaram às quartas de final da FA Cup.  

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Mick Ronson morreu de câncer em 1993, mas deixou um incrível legado. Aqui vai uma seleção do melhor de Hull, incluindo as músicas produzidas por ele. Escolhi um monte de músicas do The Housemartins porque eles foram os responsáveis por este post. Se você não se apaixonar pela voz de Tracey Thorn ou se não se pegar dançando com Fine Young Cannibals, eu devolvo seu dinheiro.

Hull’s finest or Heaven and Hull

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